Quando não encontra a sua atuação
vinculada – para além de matéria do fim e da competência, os quais são sempre
elementos vinculados -, em princípio, ou melhor, em teoria, a atuação da Administração
Pública (AP) goza de discricionariedade, de uma margem de livre decisão podendo
escolher o modo da sua atuação, conforme entende ser mais adequado.
Contudo, a questão não é de todo
assim tão linear.
Em primeiro lugar, a AP
encontra-se desde logo limitada pela prossecução do interesse público, sendo
ele o seu “norte”, nas palavras do Prof. Dr. Marcelo Rebelo de Sousa. Aliás,
este princípio administrativo encontra a sua explanação no artigo 266º/1, sendo
desse modo individualizado “em termos categóricos”. Por este motivo, não cabe a
AP decidir o interesse público a prosseguir, antes se deve cingir ao princípio
da legalidade, obedecendo à precedência e preferência de lei.
Por este motivo, a AP não deve,
não pode, prosseguir interesses privados, sob pena de ilegalidade, por desvio
de poder, gerando a nulidade do ato, nos termos do artigo 161º CPA; não
querendo com isto dizer que a sua atuação não possa afetar de modo positivo os
particulares, mas antes não pode ter como fim o alcance dessa vantagem.
Cumulativamente, a AP, na prossecução do interesse público, deve, como
anteriormente dito, prosseguir apenas os interesses expressamente definidos por
lei.
No entanto, apesar desta
limitação, dentro dela, a AP disfruta ainda de uma margem de livre decisão, na
medida em que lhe cabe decidir, por força da indeterminação do conceito “interesse
público”, qual a melhor forma de o atingir.
Em segundo lugar, a atuação da
Administração sofre ainda de outra medida de controlo, na medida em que se
encontra sujeita ao princípio da proporcionalidade.
Pese embora ser encarado como um
todo, encontramos neste princípio administrativo três dimensões. Assim, a
atuação administrativa deve ser adequada, na medida em que deve pautar-se por
condutas aptas ao fim que visam atingir; deve ser necessária, no sentido em que
o ato levado a cabo seja indispensável para a prossecução de certo fim,
escolhendo o meio menos lesivo para os interesses envolvidos; e deve, por fim,
ser razoável, não dando origem a custos superiores aos benefícios retirados da
sua atuação. Deste modo, se uma destas vertentes se encontra violada, todo o
princípio se encontra violado.
Outra limitação administrativa é
o princípio da imparcialidade, constitucionalmente consagrado no artigo 266ª/2
CRP. Na sua vertente negativa, a AP encontra-se proibida de, em cada caso
concreto, ponderar interesses, privados ou públicos, que em nada se relacionem
com o interesse legal a prosseguir. Na sua vertente positiva, este princípio
impõe à AP que, anteriormente à tomada de decisão, esta considere todos os
interesses, públicos ou privados, relevantes para a tomada de decisão.
Este princípio em nada nos aponta
para qual a decisão a tomar; antes nos diz que, seja ela qual for, tem de
obedecer a um parâmetro de imparcialidade, não considerando interesses que
sejam, objetivamente, irrelevantes.
Para além dos princípios até
agora enunciados, a AP encontra-se de igual forma limitada pelo princípio da
boa-fé que, apesar de ter uma maior relevância em sede de direito privado, vem
restringir a AP, na medida em que esta, em toda a sua atuação, deve procurar a
obtenção de resultados efetivos, não se satisfazendo com comportamentos que
falhem em atingi-los substancialmente, preenchendo assim o trâmite da primazia
da materialidade subjacente.
Mais relevante, do ponto de vista
administrativo, é o princípio da tutela da confiança, na medida em que a AP
deve salvaguardar os sujeitos jurídicos contra atuações injustificadamente
imprevisíveis daqueles com quem se relacionem. Assim, deve a sua atuação, quer
na manutenção da situação, quer na adoção de outras condutas, deve criar
confiança jurídica; deve, de forma a se observar, haver uma convicção da parte
do destinatário de que existe confiança jurídica; da mesma maneira, através de
ações ou omissões, a AP deve fazer um investimento de confiança, devendo, por
fim, haver um nexo de causalidade entre a atuação que gera confiança e a
situação de confiança.
Para além do que já ficou dito, ao falarmos num plano individual da
justiça, encontramos subjacentes os princípios da
igualdade
e da proporcionalidade, na medida em que valores impostos a um (quer ao
Estado, quer
aos
cidadãos), devem ser impostos aos outros de forma proporcional.
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Deste modo, ser justo é tratar de modo
igual o que é igual e não agir excessivamente para
além da medida adequada.
Quando este princípio é
manifestamente violado, gerará por sua vez responsabilidade civil.
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Assim, a justiça deve ser suficientemente abrangente para poder ser adotado como instrumento de interpretação e crítica do direito positivo; deve ser imposta, tanto ao Estado, devendo este cumprir esse dever para com os cidadãos; como aos cidadãos, que a devem cumprir para com os outros. Deve dar a cada um o que lhe é devido - assim, ao ser humano são inerentes direitos sociais, direitos esses que nem todos possuem, sendo então, à luz do princípio da justiça, obrigação do Estado proporcionar-lhes isso, sem esquecer o respeito pela dignidade humana.
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