A lei como pressuposto e fundamento do agere administrativo teve génese no princípio
de legalidade, como reação do Liberalismo ao regime absolutista, como
forma de subordinar a atuação administrativa à vontade popular e assegurar a
previsibilidade e a mensurabilidade das actuações dos poderes públicos pelos
cidadãos, cujo pressuposto foi materializado no artigo 6.º da Convenção dos
Direitos do Homem e do Cidadão e acolhido pela Constituição de 1822, no artigo
104.º “Lei é a vontade dos cidadãos declarada pela unanimidade ou pluralidade
dos votos dos seus representantes juntos em Cortes, precedendo discussão
pública”.
No que respeita aos regulamentos administrativos
esta exigência encontra-se expressamente consagrada no artigo 112º, n.º 7, da Constituição
da República Portuguesa, que impõe o dever de citação da lei habilitante.
VIEIRA DE ANDRADE afirma que a lei
habilitante deverá ser dotada de “conteúdo mínimo”, impondo a definição
do interesse público a satisfazer através da ação administrativa (fim)
e dos órgãos encarregados da prática dos necessários actos administrativos (competência).
O princípio da precedência de lei poderá
ser entendido, segundo MARCELO REBELO DE SOUSA, como um princípio preferência
pela decisão normativa dotada de legitimidade democrática representativa
directa ou imediata na medida em que a definição dos fins e das competências do agere
administrativo encontra fundamento nas leis
da Assembleia da República, nos decretos-leis
do Governo, e nos decretos-legislativos
regionais das Assembleias Administrativas Regionais.
O aprofundamento da integração europeia,
com a progressiva transferência de competências dos Estados Membros a favor da
União de Europeia, tem viabilizado a substituição de atos legislativos
nacionais por atos internacionais, sobretudo europeus, cujos regulamentos são dotados
de aplicabilidade direta, delineando uma nova dimensão da reserva de lei,
baseada no princípio da precedência de atos de direito europeu/internacional,
mercê da dispensa de intervenção de órgãos estaduais nacionais para que tais
normativos produzam efeitos imediatos, tal como decorre do artigo 8, n.º 1 e
n.º 3, da Constituição da República Portuguesa e do próprio Tratado de
Funcionamento da União Europeia, artigos 288.º e 289.º.
Neste sentido, ANA GONÇALVES MONIZ aponta
a jurisprudência do Tribunal de Primeira Instância da União Europeia, que em
1999, no âmbito do processo T-15 8/95A proferiu acórdão declarando que a “aplicabilidade directa do regulamento não
constitui obstáculo a que o próprio texto do regulamento habilite uma
instituição comunitária ou um Estado a adotar medidas de aplicação”, e de no
caso Francesco Bussone, o Tribunal de
Justiça da União Europeia ter afirmado da possibilidade dos regulamentos
atribuírem aos Estados Membros um poder discricionário na adoção das medidas
necessárias à sua operatividade.
Fernando Vilelas, n.º 26551,
Bibliografia:
MARCELO REBELO DE SOUSA / ANDRÉ SALGADO DE MATOS, Direito Administrativo Geral, Tomo I, 5ª ed., 2014.
MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Teoria Geral do Direito Administrativo, 2º ed. Coimbra, 2015.
DIOGO FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, Coimbra, Vol. I, 4ª ed., 2015, e Vol. II, 3ª ed. 2016.
JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, Lições de Direito Administrativo, Imprensa da Universidade de Coimbra, 4ª ed., 2015.
ANA RAQUEL GONÇALVES MONIZ, Casos Práticos Direito Administrativo, Coimbra, 2ª ed., 2015.
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